terça-feira, 26 de julho de 2022

CRÔNICAS DA PANDEMIA - Coletânea organizada por Anita Zippin e Alberto Vellozo Machado - Ano 2022.

 

 CRÔNICAS DA PANDEMIA

 

Coletânea organizada por Anita Zippin e Alberto Vellozo Machado

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Livro: CRÔNICAS DA PANDEMIA

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Capa do livro Crônicas da Pandemia.


Livro: CRÔNICAS DA PANDEMIA

Editora: Editora Bonijuris Ltda.

Organizadores: Anita Zippin e Alberto Vellozo Machado

Edição: Luiz Fernando de Queiroz e Olga Maria Krieger

Produção gráfica: Jéssica Regina Petersen

Capa: João Carlos Bonat

Projeto gráfico e diagramação: Júlio César Baptista

Ano da edição: 2022

Apresentação: Anita Zippin, Joatan M. de Carvalho.

Prefácio: Alberto Vellozo Machado

Autores de crônicas em prosa (por ordem de publicação): 

Maria do Rocio Vaz

Francisco Souto Neto

Elieder da Silva

Ludmila Kloczak

Elisa Monticelli

Emanuel Mascarenhas Padilha

Arriete Rangel de Abreu

Anita Zippin

Paulo Rogério Mudrovitsch de Bittencourt

Vera Rauta

Valéria Borges da Silveira

Engelbert Schlögel

Ney Fernando Perracini de Azevedo

Vânia Maria Souza Ennes

Júlio Ernesto Bahr

Maria do Rosário Knechtel

Cássia Cassitas

Kátia Santana

Vítor Beal

Joana Rolim

Edilson Elias

Alberto Vellozo Machado

Maria Júlia Carreira Pacheco

Hamilton Bonat

Lucrécia Welter

Simone Kronland

Ross Mary Capriotti Strano Vieira

Autores em poesia (por ordem de publicação):

Ângela Maria dos Santos

Odilon Reinhardt

Arioswaldo Trancoso Cruz

Lília Souza

Jadson Porto

Dione Mara Souto da Rosa

Alberto Vellozo Machado

Marlene Marques

Vera Rauta

Ângela Maria dos Santos

Cíntia Maria Honório

Mário Frota

Valéria Borges da Silveira

Thiago de Azevedo Pinheiro Hoshino

Helena Slongo

Helga Viezzer

Mamed Zauíth

Andréa Motta

Edson Ribas Malachini

Sérgio Ferraz

Madalena Ferrante Pizzato

Rô Caron

 

O livro CRÔNICAS DA PANDEMIA

 

Anita Zippin, que preside a Academia de Letras José de Alencar – ALJA em Curitiba, e Alberto Vellozo Machado, membro do mesmo sodalício, idealizaram a publicação de uma coletânea lítero-poética versando sobre a pandemia da Covid-19, que reunisse autores também de outras instituições ligadas às letras, tais como o Centro de Letras do Paraná, a Academia Feminina de Letras do Paraná, a Academia Paranaense da Poesia, o  Observatório da Cultura Paranaense e a União Brasileira de Trovadores Seção Curitiba.

Luiz Fernando de Queiroz, da Editora Bonijuris Ltda., que há anos tem dado grande apoio à ALJA, prontificou-se a editar a obra. Assim, os convites foram feitos a inúmeros intelectuais, para que participassem da concepção do livro. A mencionada advogada Anita Zippin sugeriu aos autores que não se referissem especificamente ao horror da doença que envolveu todo o planeta – e que ainda nos fustiga –, mas que em textos curtos procurassem aspectos de menos austereza.

Estávamos no terceiro ou quarto mês da pandemia, em 2020, quando escrevi minha crônica. Denominei-a “A vida escancarada de meus simpáticos vizinhos”. Impresso e lançado o livro no corrente mês de julho de 2022, vejo meu trabalho estampado em segundo lugar, à página18.

A apresentação da obra vem assinada por Anita Zippin e Joatan M. de Carvalho, respectivamente presidenta e 1º vice-presidente da ALJA.

A capa do livro é da autoria de João Carlos Bonat, meu confrade da Academia. Muito bem inspirada e não menos do que genial, a capa de Bonat mostra  um homem moderno que usa a antiga máscara denominada doctore, que os médicos venezianos adotaram na Idade Média quando a peste chegou ao Vêneto, e que consiste na cara de um pássaro com longo bico. Dentro daquele enorme bico os médicos carregavam flores, cujo perfume não apenas tentava disfarçar um pouco o cheiro dos corpos em putrefação, como também imaginavam eles que o perfume afugentasse a peste. Pobres doutores daqueles tempos medievais, que não sabiam que a Peste Negra era transmitida por pulgas.


Gravura antiga que mostra um "Doutor da Peste" andando por Veneza na Idade Média, com a máscara que, carregando flores dentro do bico, imaginava estar protegido do contágio.

Pequena máscara "doctore" que comprei em Veneza.

O livro “Crônicas da Pandemia” foi lançado no dia 5 do corrente mês de julho de 2022, no salão nobre do 2º andar do Tribunal de Justiça do Paraná. Eu não compareci às solenidades do lançamento porque continuo em isolamento, sem entrar em ambientes fechados e com muitas pessoas presentes.  

 

Anita Zippin, presidenta da Academia de Letras José de Alencar - ALJA. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

Anita Zippin entre Joatan Marcos de Carvalho, 1º vice-presidente da ALJA, e Alberto Vellozo Machado, prefaciador de Crônicas da Pandemia e organizador da obra. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

 
Joatan Marcos de Carvalho, Anita Zippin (exibindo Crônicas da Pandemia) e Alberto Vellozo Machado. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

 
A plateia durante a solenidade. A acadêmica Dione Mara Souto da Rosa, de blusa verde, é uma das poucas pessoas presentes a usar máscara de proteção contra a covid.  Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

 
Luiz Fernando de Queiroz, proprietário da Editora Bonijuris, que graciosamente editou Crônicas da Pandemia. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

 
O acadêmico João Carlos Cascaes, diretor da ALJA, que na mesma ocasião lançou seu livro Ética & Envelhecimento. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

 

Ética e Envelhecimento, de João Carlos Cascaes, em lançamento simultâneo com Crônicas da Pandemia. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu.

 
O acadêmico João Carlos Bonat, autor das capas de Crônicas da Pandemia e Ética & Envelhecimento, ao lado de Anita Zippin, presidenta da ALJA. Crédito fotográfico: SemeARTE Cultura - Arriete Rangel de Abreu. 

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“A vida escancarada de meus simpáticos vizinhos”


 
Capa de Crônicas da Pandemia.

Primeiras páginas do livro.

Páginas 18 e 19 da crônica de Francisco Souto Neto.

Páginas 20 e 21 da crônica de Francisco Souto Neto, que vai inteiramente transcrita abaixo, para facilitar a leitura.


Francisco Souto Neto, autor de A vida escancarada de meus simpáticos vizinhos, durante a pandemia.

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A VIDA ESCANCARADA DE MEUS SIMPÁTICOS VIZINHOS

por Francisco Souto Neto

  

QUEM SE ENCONTRA, COMO EU, em quarentena por causa da brutal e devastadora pandemia que assola o planeta,  quando se sente enfadado de tanto ler, de espanar o pó da casa, de assistir a muitos programas e noticiários da televisão, de ouvir música, de ficar no teclado do computador, de se atrever nas teclas do piano e de assistir a centenas de filmes, o que resta é olhar o mundo exterior pela janela. Observar, muito abaixo, os carros, e na rua gente mascarada ou não, as atividades de pessoas dentro dos seus escritórios e apartamentos nos prédios ao redor, o movimento das nuvens, o voo dos pássaros e as alvoradas e crepúsculos.

Hoje quero referir-me a um casal que vive num prédio que fica aos fundos do meu, que avisto não apenas das duas janelas do meu quarto, mas também da minha área de serviço e do quarto de empregada. O apartamento duplex de cobertura situa-se à altura do meu andar; só a caixa d’água e a casa de máquinas do elevador ficam acima do meu ponto de vista.

Não sou indiscreto, porque esse casal – que apelidei Zaribu e Zaribua – mostra-se com naturalidade. Ambos, mas não sempre, me parecem meio tristes, sorumbáticos. Já há alguns meses, antes mesmo da pandemia, notei primeiro o macho. Quero dizer, não tenho muita certeza, mas creio que era o macho, e ele me pareceu um urubu muito solitário.

Mas na sequência, foi o meu amigo Rubens quem percebeu que ele não era solitário, pois passou a fazer-se acompanhar de quem seria a fêmea, ou vice-versa, pois ninguém sabe distinguir o sexo dos urubus. Ou, provavelmente, um expert saiba distinguir os gêneros, porém isto não é o que importa. O que vale ressaltar é que eu – quem diria?! – passei a observar os urubus, meus simpáticos vizinhos.

Os dois estão sempre juntos. Pela manhã ficam nos vértices do prédio, até nos locais mais altos, porém maior parte do tempo estão no parapeito do terraço da cobertura.

Abrem as asas para receber o sol da manhã, e fazem minuciosa limpeza das suas penas. O curioso é que de vez em quando a fêmea – ou que me parece ser ela – salta do parapeito para dentro do terraço. O macho passa um largo tempo olhando para baixo, para dentro daquele espaço aberto que eu não alcanço com meus olhos. Desconfio que ali exista um ninho.

Nos dias frios deste inverno, vejo-os desde o amanhecer pelas bordas altas do prédio. Quando chove, ficam lado a lado macambúzios, tristes, mas é só parar a chuva ou o chuvisco, que ambos abrem as asas, um de cada vez ou simultaneamente, talvez à espera de um raiozinho de sol, e ali continuam a enfrentar a friagem. Algo estranho que os urubus fazem: para fazer face ao vento frio, em vez de fechar as asas para aquecerem-se, eles também as abrem. De fato nós, humanos e leigos, nada entendemos da lógica dos urubus.

Ao contrário do meu preconceito desde a infância, os urubus são bichos tímidos e retraídos, mas doces, simpáticos, quase bonitos, apesar de viverem a comer carniças, isto é, animais mortos. Mas que animais mortos poderão alimentar os tantos urubus que às vezes vejo voando em círculos nos céus de Curitiba? Talvez as ratazanas que morrem dentro dos terrenos baldios e abandonados.

Ao final de cada manhã Zaribu e Zaribua desaparecem. Creio que voam para longe da cidade, talvez para as matas além da área metropolitana, em busca de animais putrefatos.

Os urubus, longe de desprezíveis, são aves muito importantes para a ecologia porque se alimentam somente de carne em decomposição, e assim limpam o ambiente. Não comem nem milho, que faz as delícias de suas primas galinhas. É estranho que, comendo carne podre, os urubus não adoençam. Certamente existe em seu sistema imunológico algo que os impede de adoecer.

Procurei por informações na internet e descobri que as fêmeas dos urubus botam apenas dois ovos por período fértil, que eclodem após 32 a 39 dias. Os filhotes nascem claros, e escurecem com o tempo. Eles vivem de 8 a 12 anos, e estão prontos para se reproduzir aos 3 de idade. É uma pena que minha vista não alcance o interior do terraço, e aí consiste o mistério. O que os dois fazem quando ali estão? E quando vejo que apenas um deles desaparece um metro abaixo, dentro daquela área aberta, imagino que seja a Zaribua chocando os ovos.

Entretanto existe vida humana no apartamento de cobertura. Nunca vi esses vizinhos discretos, mas sei que ali existe alguém porque as janelas que dão para o terraço algumas vezes estão abertas, outras fechadas, ou parcialmente abertas, o mesmo se dando com as cortinas persianas. Serão humanos ecologistas que respeitam a invasão dos urubus? Parece-me claro que eles sabem que os urubus estão por ali, pois devem restar penas no chão e muito cocô também nos largos parapeitos. O casal de urubus gosta de variar um pouco de “puleiro”, permanecendo algum tempo lá no alto da casa de máquinas, nas saliências da arquitetura de variados pontos, mas sua preferência recai sempre pelo parapeito do terraço.


Zaribu e Zaribua no apartamento de cobertura do prédio aos fundos do meu. 

Há pouco notei que Zaribu e Zaribua andavam de um lado ao outro no peitoril do terraço. Olhavam para baixo, para longe, para os lados, e como de costume observaram-me fixamente. Devem achar que sou um bicho qualquer porém amistoso. Então com ânimo lançaram-se ao mesmo tempo ao espaço, passando a uns dois metros da minha janela e desapareceram em direção ao sol. 

De resto, fico na rotina do meu dia a dia isolado, atento às notícias do país, que está nas mãos de um presidente esquizofrênico e irresponsável, que desde o início da pandemia manifestou-se e agiu insanamente contra o isolamento social e o uso de máscaras. Aguardo ansioso pelas eleições de 2022, que espero alcançar para ver mudar o país para melhor. É claro que, entretanto, minha maior expectativa é pela vacinação contra a covid 19 em todo o planeta.

Outra anseio é ver os dois urubuzinhos filhotes andando sobre o parapeito do terraço do prédio vizinho, olhando para baixo, buscando coragem para enfrentar o primeiro voo. Felizes os urubus que são independentese altivos, imunes à pandemia, se satisfazem com um simples pedaço de carne pútrida e nada sabem de política.

Vida longa a Zaribu, Zaribua e a sua feliz e inocente próxima prole.

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